Muito provavelmente você já deve ter escutado no jornal ou na televisão a seguinte frase “e fulano irá responder pelo crime culposo, quando não há intenção de matar” ou algo semelhante. Uma pessoa leiga no assunto, mas atenta à notícia, talvez pergunte: se ele responderá culposamente, porque disseram que não havia a intenção?
E essa é uma confusão completamente normal. Eu mesmo, autor, quando escutava essa frase, questionava. Mas essa é uma questão é fácil de responder e irei respondê-la aqui.
Análise do Crime
Analisar se um crime é culposo ou doloso é analisar um crime sobre a óptica da conduta em um Fato Típico. O dolo ou culpa, a ação ou omissão, o erro de tipo, são possibilidades da conduta do agente do crime.
Dito isso, fica mais fácil compreender que o crime não será sempre um ato de fazer, as vezes pode ser um ato de não fazer, de se abster, ou de simplesmente aceitar que possa acontecer um resultado criminoso, mesmo que não tenha a vontade direta pelo resultado.
O Artigo 18
O Art. 18 do código penal nos define o que são os Crimes Dolosos e Crimes Culposos.
O inciso I nos diz que o crime é doloso quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzí-lo. Em seguida, o inciso II nos diz que o crime culposo é quando o agente dá causa ao resultado em decorrência de imprudência, negligência ou impericia.
Essa é a explicação simples, o texto de lei básico. Mas para que a diferença seja mais clara, ainda podemos melhorar essa explicação.
A regra é que as pessoas sempre irão cometer um crime doloso. Elas cometem com a vontade de realizar o ato e atingir o resultado criminoso. É a regra. A exceção, por outro lado, é o crime culposo, que só existe quando estiver expresso no tipo penal. Podemos identificar isso no Parágrafo único do Art. 18 do CP.
E aqui eu já explico, dizer que o crime foi culposo não tem nada a ver com o autor assumir a culpa ou assumir ser o responsável pelo crime. É uma terminologia jurídica. A palavra “Dolo”, pelo contrário, tem o sentido de vontade, de responsabilidade e intenção do agente.
Claro que isso não é presunção de culpa (no sentido de ser de fato o criminoso), apenas indica que o crime cometido requer que o agente tenha tido a vontade de cometê-lo.
Doloso X Culposo
Dessa forma temos o crime doloso, um crime que o agente tem a vontade de cometer, que busca a ação criminosa, e temos o crime culposo, quando o agente do crime não queria de fato o resultado, não desejava realizar o crime, mas por imprudência, negligência ou imperícia acaba concretizando um resultado lesivo involuntário que era previsível.
Os exemplos clássicos para retratar esses dois tipos de crime é a comparação de um homicídio e um homicídio culposo no transito.
Um homicídio “normal”, previsto no Art. 121 do CP, pode acontecer quando alguém pega em uma arma e dispara contra outra pessoa para matá-la, se alcançar seu objetivo, o crime será doloso.
O homicídio culposo no transito está previsto no Código de Transito Brasileiro no Art. 302, e pode ocorrer quando alguém resolve dirigir um veículo automotor enquanto, por exemplo, está embriagado. Quem faz isso não tem a intenção de causar um acidente e potencialmente matar alguém, mas esse resultado é muito provável e esperado, já que o condutor sabe que está embriagado e qual o efeito dessa circunstância em sua direção.
Imprudrência, Negligência e Imperícia
Aproveito para explicar quais são as modalidades do crime culposo, sejam elas a imprudrência, negligência e imperícia.
A imperícia presume a falta de conhecimentos técnicos no exercício de arte ou profissão, quando falta técnica ou habilitação necessária. É uma conduta “comissiva” em que só acontece quando há ação do agente. Podemos citar o exemplo do motorista que dirige sem carteira de habilitação ou médico que não tem capacidade técnica para realizar o procedimento médico.
A imprudência é uma atitude (portanto também é comissiva) tomada pelo agente sem observar os cuidados necessários (e exigíveis). Podemos citar exemplos quem caça em local inadequado/movimentado por muitas pessoas ou quem dirige sem óculos.
A negligência, ao contrário dos anteriores, é omissiva, não exige ação do agente, mas sim uma omissão. Acontece quando o agente demonstra falta de cuidado, preguiça mental e desleixo proposital em determinada situação. Caso clássico é o de deixar componentes tóxicos ao alcance de crianças, ou esterilização de equipamentos médicos.
O Crime preterdoloso
O Crime preterdoloso é uma fusão dos crimes dolosos e culposos. É um situação jurídica curiosa, mas possível. Acontece quando o agente no desejo de realizar um crime X, realiza sem querer (por negligência, imperícia ou imprudência) também um crime Y, que é mais grave.
É diferente do concurso material de crimes, quando um agente, mediante duas ou mais ações realiza dos crimes. No caso do crime preterdoloso, o agente NÃO tinha a intenção de cometer os dois crimes. No concurso de crimes o agente tem essa intenção.
Um exemplo de crime preterdoloso é o de Lesão Corporal seguida de morte, Art. 129, § 3º, CP.
Referências e Bibliografia
Manual de direito penal / Guilherme de Souza Nucci. – 16. ed. – Rio de Janeiro: Forensse, 2020.
Gomes, Luiz Flavio; Garcia-Pablo de Molina, Antonio. Direito penal parte geral, cit., p. 422
COLUNISTA PORTAL. Crime Culposo: Conceito. [S. l.], 2021. Disponível em: https://siteantigo.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/direito/crime-culposo-conceito/61154#. Acesso em: 4 mar. 2021.
Qual a diferença entre negligência, imprudência e imperícia?. [S. l.], 2020. Disponível em: https://matheussarasa.jusbrasil.com.br/artigos/908193361/qual-a-diferenca-entre-negligencia-imprudencia-e-impericia?ref=feed. Acesso em: 4 mar. 2021.
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