Se por acaso não era do seu conhecimento que todo o poder do Estado pertence a você, que fique, agora, sabendo.
Isso porque, a nossa Constituição consagrou a soberania como um dos fundamentos máximos da República (vide artigo 1º, I) e, ainda, determinou que ela pertencesse ao povo (vide parágrafo único do mesmo dispositivo).
O exercício da Soberania Popular
Ocorre que, todo este poder, deve ser exercido por meio de representantes eleitos – ou seja, através da democracia representativa mediante direito ao voto (artigo 14º, caput), momento no qual o povo transfere a sua titularidade e, logo, o seu poder, aos citados representantes (vê-se, portanto, a importância do voto e, mais ainda, de se votar consciente) – ou diretamente – trata-se, na verdade, da chamada democracia semidireta ou representativa que, no caso, é exercida mediante plebiscito, referendo e iniciativa popular (artigo 14, I, II e III, respectivamente).
A iniciativa popular, como a sua própria semântica nos revela, se origina do povo e, portanto, de seu próprio interesse, independente, assim, da atuação dos agentes políticos, bastando, para que “o povo apresente projetos de lei ao legislativo” [i], aproximadamente 1,5 milhão de assinaturas distribuídas por, pelo menos, 5 Estados da Federação, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles (vide artigo 13, caput, da Lei 9.709/1998) – até hoje, apenas 4 (quatro) leis decorrentes de iniciativa popular foram promulgadas, sendo elas: Lei 8.930/1994 – sobre crimes hediondos -, Lei 9.840/1999 – sobre o combate à compra de votos -, Lei 11.124/2005 – sobre o SNHIS e o FNHIS – e, por fim, a famigerada Lei da Ficha Limpa – Lei 135/2010.
Já os instrumentos plebiscito e referendo, objetos do presente Jus Explica, são mecanismos de consulta e participação popular acerca de matéria de acentuada relevância, de natureza constitucional, legislativa ou administrativa (artigo 2º, caput, da Lei 9.709/1998).
Plebiscito ou Referendo?
Ambos são formas do exercício da soberania popular e a diferença entre eles é o momento da sua execução².
O plebiscito, conforme dispõe o § 1º, do artigo 2º, da Lei 9.709/1998, é convocado em momento anterior a ato legislativo ou administrativo, cabendo ao povo, pelo voto, aprovar ou denegar o que lhe tenha sido submetido, enquanto o referendo é convocado em momento posterior a ato legislativo ou administrativo, cumprindo ao povo, também pelo voto, a respectiva ratificação ou alteração (artigo 2º, § 2º, da citada Lei).
Portanto, enquanto o plebiscito funciona como ato de orientação às autoridades públicas e parlamentares eleitos, o referendo funciona como um ato de convalidação do povo para decisão que já foi tomada na esfera pública.
Quem escolhe quando votar?
Certo, mas como, então, o povo participa dos citados instrumentos, ele pode se autoconvocar? A resposta é não, já que, de acordo com o artigo 49, XV, da Constituição c/c artigo 3º da Lei 9.709/1998, a realização de plebiscito e referendo depende de convocação mediante decreto legislativo proposto por, no mínimo, 1/3 dos votos dos membros que compõem qualquer das Casas do Congresso Nacional, que detém competência exclusiva para tanto.
O resultado
Tanto o plebiscito e o referendo necessitam da maioria simples (51 de 100 votos, por exemplo) para serem aprovados.
Uma vez realizada a votação, seus resultados devem ser acatados. Conforme ensina Pedro Lenza “uma vez manifestada a vontade popular, esta passa a ser vinculante, não podendo ser desrespeitada”.
Logo, no caso de um plebiscito, os projetos de lei que tenham como objeto a matéria em consulta popular serão suspensos até que se obtenha o resultado da votação, que vinculará o poder público (legislativo administração pública), obrigando-o a tomar providências para a concretização da vontade popular.
Igualmente, no caso de um referendo, o projeto de lei aprovado poderá ser objeto de votação em até 30 dias, que decidirá pela sua aprovação definitiva ou arquivamento.
Logo, caro leitor, você que transferiu, repita-se, o seu poder aos representantes eleitos, trate, então, de provocá-los a te convocar, principalmente porque, desde a promulgação da Constituição de 1988, os referidos instrumentos foram utilizados cada um uma única vez em nível federal (referimo-nos, aqui, ao plebiscito de 1993, em que o povo foi consultado sobre a forma – monarquia ou república – e o sistema de governo – parlamentarismo ou presidencialismo -, decidindo, ao fim, pela manutenção da República Presidencialista, e ao referendo de 2005, em que o povo foi consultado sobre a proibição da comercialização de arma de fogo e munição), mesmo estando eles diretamente atrelados ao exercício da soberania popular e, inclusive, da própria democracia, já que democracia e soberania popular estão umbilicalmente vinculadas.
Referências e bibliografia.
DA SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 25. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2005. Pág. 141
SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de direito constitucional. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2021. Pág. 122