Se você já adquiriu um produto ou serviço com o qual não ficou satisfeito, sabe como é frustrante ter gasto com algo que não lhe trouxe o resultado esperado. Ainda mais quando essa insatisfação decorre de um problema não esperado do próprio consumo, o dito “defeito”. Embora tenhamos o costume de utilizar genericamente a palavra defeito para todos os problemas que serviços e produtos apresentem, essa expressão nem sempre é a mais precisa. Neste texto explicarei qual é a diferença entre Vício e Defeito de consumo.
Entendendo o Defeito
Existe uma imprecisão legislativa no código do consumidor. Isso porque o legislador aplicou de forma despreocupada o termo “defeito” quando deveria ter utilizado o termo “fato do produto ou serviço”, confundindo o leitor desavisado.
O Código de Defesa do Consumidor apresenta três denominações: defeito, fato e vício do produto, sendo que defeito e fato são a mesma coisa. Ou seja, existem os defeitos/fatos e os vícios.
Agora, qual será a diferença entre defeito e o vício? Essa diferença tem importância para o consumidor?
Diferença entre Defeito e Vício?
A diferença entre o defeito e o vício é extremamente importante para o consumidor, pois são dois níveis diferentes de exposição ao risco e dano.
Defeito
O Defeito é aquele fato do produto ou serviço que de alguma forma causa insegurança ao consumidor. Essa insegurança geralmente é física, mas também pode ser moral. Assim, o defeito do produto/serviço é aquele problema de consumo que, ao se exteriorizar, causa danos ao consumidor, o chamado acidente de consumo.
O Código coloca da seguinte forma:
Art. 12, §1 O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: (…)
Art. 14, §1 O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: (…)
Um exemplo de defeito: quando o consumidor compra um aparelho celular e, ao chegar em casa, o liga à tomada para carregar a bateria. Ainda com o aparelho em mãos, este explode causando ferimentos.
A responsabilidade pelo Defeito
No caso do Defeito a responsabilidade é objetiva e independe de culpa. Ou seja, é necessário apenas mostrar que o dano possuí um nexo causal com o fato do produto.
Dessa forma, o caput do art. 12 do CDC determina que podem ser responsabilizados de forma solidária o fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.
Excepcionalmente, o comerciante que põe o produto ou serviço à venda poderá ser responsabilizado quando:
- o fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados;
- o produto for fornecido sem identificação clara do seu fabricante, produtor, construtor ou importador;
- não conservar adequadamente os produtos perecíveis.
No caso de defeito, em que há um dano ao consumidor, o prazo para uma ação indenizatória é prescricional de 5 anos.
Profissionais liberais
Uma exceção à responsabilidade objetiva é a responsabilização de profissionais liberais, que neste caso dependem da comprovação de culpa por parte do profissional. São exemplos de profissionais liberais o médico, engenheiro, advogado, etc.
Vício
O Vício do produto ou serviço é, por outro lado, a má adequação desse ao mercado de consumo. Portanto, no vício, o produto ou serviço apresenta problemas na sua qualidade ou quantidade que o tornam impróprio ou inadequado ao consumo. Inclusive diminuindo seu valor.
O vício atinge o consumidor indiretamente, portanto, não há um dano à saúde e segurança ao consumidor da mesma forma que há no defeito.
O Código de Defesa do Consumidor coloca da seguinte forma:
Art. 18 Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas. (…)
Art. 20. O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: (…)
Seguindo o mesmo exemplo do aparelho celular: desta vez o aparelho apenas deixa de emitir sons, ficando completamente mudo, sem causar um dano direto ao consumidor.
Assim, o vício tem duas classificações possíveis: de quantidade ou de qualidade.
Qualidade: aqueles que tornem o produto impróprio ou inadequado para consumo (fora do prazo de validade, falsificado, deteriorado), ou que diminuam seu valor de alguma forma ou ainda que tenha alguma disparidade entre o produto real e a informação fornecida.
Quantidade: conteúdo em quantidade inferior a indicada na embalagem ou divulgação.
A responsabilidade pelo Vício
A responsabilidade pelo vício também é objetiva e independe de culpa, mas nesse caso o código apenas diz que “os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios (…)”.
Dessa forma, a expressão fornecedores deve ser compreendida como aqueles elencados no art. 3° do CDC, nos seguintes termos:
Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
Ou seja, no defeito há um rol taxativo de quem será solidariamente responsável, enquanto que no vício qualquer fornecedor que se adeque ao art. 3° poderá ser responsabilizado.
Nos casos de vício, o consumidor tem o prazo decadencial de 30 dias para os serviços e de produtos não duráveis e 90 dias para os duráveis, que contam a partir da entrega do serviço e produto. No caso dos vícios ocultos, de difícil constatação, contará a partir do momento em que se percebe o vício.
Conclusão
Percebe-se que o defeito (fato) e vício do produto e serviço são duas situações em que a relação de consumo não se satisfaz, trazendo, de uma forma, um prejuízo ao consumidor. Entretanto, entre defeito e vício, existe uma diferença importante nesse prejuízo, já que no defeito o prejuízo é de dano à própria saúde do consumidor, enquanto que no vício esse prejuízo se restringe ao produto ou serviço de consumo.
Bibliografia e referências
SOUZA, S.C.D.; WERNER, J.G.V.; NEVES, T.F.C. Direito do Consumidor. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788530981273/. Acesso em: 18 de maio de 2022
ALMEIDA, Fabricio Bolzan de. Direito do consumidor esquematizado. 8. ed., 2020.
Código de Defesa do Consumidor: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078compilado.htm
Leia também: Verdade ou mentira? Código de Defesa do Consumidor