A diferença entre Estado de Defesa e Estado de Sítio

Estado de Defesa e Estado de SítioNa última sexta-feira, dia 19 de março, ouvimos do Presidente da república a menção ao Estado de Sítio. Enquanto falava à imprensa, disse “[…] Retirar o direito de ir e vir das pessoas, isso para estado de sítio, estado de defesa, e não é só eu, é o Congresso também sendo ouvido, caso o contrário nós vamos sucumbir. Vamos ter que reagir.”

Ainda ontem, dia 20, em reunião com o Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Luiz Lux, o próprio Presidente afastou a possibilidade da medida.

A fala foi dada em contexto das medidas tomadas por governadores no combata ao Covid-19. Medidas as quais, na visão do Presidente, levariam a desobediência civil e consequentemente uma “ação do governo federal dura”.

Isso nos trouxe a questão, um Estado de Sítio é cabível nesses momentos? Qual a diferença de um Estado de Sítio e um Estado de Defesa?

A previsão Constitucional

Uma constituição é elaborada pensando em momentos de normalidade, um ambiente normal de temperatura e pressão das instituições, do Estado e da Sociedade, mas toda sociedade passa por crises, sejam elas de natureza política, ambiental/climática ou somente social.

Assim, é comum encontrar nos textos constitucionais disposições para que a governo e a sociedade lide com essas crises de maneira mais contundente.

Na nossa Constituição Federal há o capítulo V, chamado de “DA DEFESA DO ESTADO E DAS INSTITUIÇÕES DEMOCRÁTICAS”, em que prevê os Estado de Sítio e de Defesa, mecanismos conhecidos como uma espécie de Legalidade Extraordinária.

Para sua instauração e manutenção é necessário observar a necessidade e a temporariedade, dois princípios que se rompidos, caracterizam um avanço autoritário sobre o Estado Democrático de Direito.

Estado de Defesa

O objetivo do Estado do Defesa é preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza, como é dito pelo próprio Art. 136 da CF.

Portanto, o Estado de Defesa só vale para localidades específicas, não tem abrangência nacional.

Regras do Estado de Defesa

O Estado de Defesa acontece via decreto presidencial, somente o presidente pode decretá-lo, mas antes disso, deve ouvir o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional. Ambos os conselhos não tem força para vincular o presidente, mas a opinião deles deve ser levada em conta.

Ouvidos os conselhos, o decreto pode ser publicado e a situação já está valendo. Só que a coisa não para por aí, essas Legalidades Extraordinárias sofrem um controle político e jurídico, para que se garanta a legalidade e efetiva necessidade do seu uso. Por isso, após decretado, o presidente tem 24 horas (um dia) para enviar o decreto para o Congresso Nacional, que irá aprovar ou rejeitar o decreto em até 10 dias.

O controle jurídico acontece de forma judicial, durante e após a decretação do Estado de Defesa, julgando eventuais abusos ou a constitucionalidade dos atos.

Possibilidades

O Estado de Defesa pode ser decretado pelo prazo de 30 dias corridos, que são prorrogáveis por mais 30 (a prorrogação deve ser enviada ao congresso também).

Nele, o presidente pode restringir os direitos de:

  • reunião, ainda que exercida no seio das associações;
  • sigilo de correspondência;
  • sigilo de comunicação telegráfica e telefônica

Também, a ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos, na hipótese de calamidade pública, respondendo a União pelos danos e custos decorrentes.

Prisão

Também está previsto que na hipótese de prisão por crime contra o Estado (uma quarta forma de prisão), esta deve ser imediatamente comunicada ao juiz competente, que deverá decidir se ela será relaxada (soltura) caso não seja Legal, não podendo ser maior do que 10 dias, salvo se autorizado pelo Poder Judiciário.

Também, vedada a incomunicabilidade do preso.

Estado de Sítio

O Estado de Sítio é muito similar ao de Defesa, mas ele é mais abrangente e severo. Ele tem dois objetivos centrais, o ofensivo, nos casos de comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa, e o defensivo, nos casos de declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira, como diz o Art. 137 da CF.

Diferentemente do Estado de Defesa, o de Sítio pode ter abrangência nacional.

Regras do Estado de Sítio

O Sítio também ocorre via decreto, que compete exclusivamente ao Presidente. Também precisa ouvir os Conselhos, que não tem força vinculante, mas precisa pedir autorização ao Congresso, sem ela, não há decreto.

Ou seja, no Estado de Defesa o controle político acontece após a decretação e durante a vigência do decreto, no Estado de Sítio, o controle começa antes mesmo da decretação, continua concomitantemente e persiste sucessivamente após o fim de sua vigência.

O Congresso Nacional deve apreciar o documento em até 5 dias, e decidir sobre sua validade em maioria absoluta.

O Judiciário também realiza o controle concomitante e posterior dos atos.

Possibilidades

O Decreto deve indicar por quanto tempo a medida irá valer (que pode ser de até 30 dia prorrogáveis, quando no caso ofensivo, ou até que cesse a agressão armada estrangeira, no caso defensivo), as normas necessárias a sua execução e as garantias constitucionais que ficarão suspensas.

O decreto indicará sua duração, as normas necessárias a sua execução e as garantias constitucionais que ficarão suspensas, e, depois de publicado, o Presidente deve designar um executor das medidas específicas e as áreas que serão abrangidas.

Na vigência do estado de sítio decretado com fundamento no art. 137, I (ofensivo), só poderão ser tomadas contra as pessoas as seguintes medidas:

  • obrigação de permanência em localidade determinada;
  • detenção em edifício não destinado a acusados ou condenados por crimes comuns;
  • restrições relativas à inviolabilidade da correspondência, ao sigilo das comunicações, à prestação de informações e à liberdade de imprensa, radiodifusão e televisão, na forma da lei;
  • suspensão da liberdade de reunião;
  • busca e apreensão em domicílio;
  • intervenção nas empresas de serviços públicos;
  • requisição de bens.

Congresso Nacional

Embora exista a possibilidade da suspensão de alguns direitos constitucionais em ambas as situações, o Estado ainda mantém sua estrutura de Estado Democrático de Direito, embora essa existência não seja plena enquanto vigorarem os Estados de Defesa e Sítio.

Uma evidência é que esses estados não permitem a dissolução do congresso nacional, que deverá permanecer atuante enquanto estiverem instauradas as Legalidades Extraordinárias. A Constituição prevê que a Mesa do Congresso Nacional deve designar uma Comissão composta de cinco de seus membros para acompanhar e fiscalizar a execução das medidas referentes ao estado de defesa e ao estado de sítio.

Outra questão importante é o prazo, que se não respeitado caracterizaria uma ilegalidade por completo, pois a partir desse desrespeito não há mais a obediência das normais legais.

O Estado de defesa e Estado de Sítio, portanto, são restrições aos Direitos Fundamentais. Restrições tomadas em decorrência de calamidades públicas, grave comoção nacional, guerra, e que portanto, só devem acontecer de forma muito excepcional em situações drásticas.

Fontes e Bibliografia.

Robson Bonin. Bolsonaro diz a Fux que não há decreto de estado de sítio. Veja, [s. l.], 19 mar. 2021. Disponível em: https://veja.abril.com.br/blog/radar/bolsonaro-diz-a-fux-que-nao-ha-decreto-de-estado-de-sitio/. Acesso em: 20 mar. 2021.

Constituição Federal. Disponpivel em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm

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Lucas Machado

Advogado, graduado em Direito pela Universidade Cruzeiro do Sul. É membro da Comissão da Jovem Advocacia e da Advocacia Empreendedora e Inovação da OAB Jabaquara/SP e integrante como Qualify no IFL Jovem - SP. Fundador, Editor e Escritor do Blog Jus Talks, destinado ao Direito e atualidades correlatas. Jovem, dedica-se a diversas áreas de atuação, principalmente no contencioso cível, societário, consumidor e empresarial, oferecendo soluções jurídicas eficientes e alinhadas às atualidades.
Estado de Defesa e Estado de Sítio

A diferença entre Estado de Defesa e Estado de Sítio

Uma constituição é elaborada pensando em momentos de normalidade, um ambiente normal de temperatura e pressão das instituições, do Estado e da Sociedade, mas toda sociedade passa por crises, sejam elas de natureza política, ambiental/climática ou somente social. Assim, é comum encontrar nos textos constitucionais disposições para que a governo e a sociedade lide com essas crises de maneira mais contundente.

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