Costumes x contra legem na prática Civil

Atualmente o Decreto-Lei 2.041, de 1940¹, que regula o exercício do comércio ambulante, proíbe a subida dos vendedores nos veículos em movimento para oferecer a mercadoria aos clientes, conforme o dispositivo Art. 9º, in verbis: “É vedado subir nos veículos em movimento para oferecer a mercadoria”.

Agora vem uma provocação epistemológica, de analisarmos a seguinte problemática, sabemos que o comércio informal é bem grande, não vou me alongar em trazer estatísticas e dados, pois ficar um artigo de mestrado/doutorado, pois teria que acrescentar microeconomia e afins.

Todavia, isso se tornou um costume, que é denominado uma prática de um certo grupo, ou uma forma de organização cultural daquele estado, como aqui em São Paulo, sob a prática de comércio ambulante nos transportes como no caso, trem e metrô.

Por mais que seja um costume de nossa cidade, não deixa de ser contra a lei, pois o Decreto-Lei 2.041 de 1940 e seu Art. 9 veda essa possibilidade, porém, ela é mitigada, por que se realmente fosse aplicar essa literalidade no caso concreto, não teríamos nenhum ambulante dentro dos vagões, certo?

Dai vem o mais interessante, pelo visto deste costume, a maioria das pessoas entendem que essa prática ilegal por lei não deixa de ser um trabalho justo, pois não ofende a moral e integridade física dos passageiros e nem traz uma insegurança no que tange a uma grave ameaça para si.

Dai entramos no campo filosófico Kantiano dos imperativos categóricos e hipotéticos, sendo explicado por Bobbio²:

Imperativos categóricos são aqueles que prescrevem uma ação boa em si mesma, isto é, uma ação boa em sentido absoluto, que deve ser cumprida incondicionalmente, ou com nenhum outro fim a não ser o seu cumprimento enquanto ação devida.

[…] Imperativos hipotéticos são aqueles que prescrevem uma ação boa para atingir o fim, isto é, uma ação que não é boa em sentido absoluto, mas boa somente quando se deseja, ou se deve, atingir um fim determinado, e assim é cumprida condicionalmente para a obtenção do fim.

[…] Os imperativos categóricos seriam próprios, segundo Kant, da legislação moral, e podem, portanto, ser chamados de normas éticas.

Quanto aos imperativos hipotéticos, segundo Kant, distinguem-se, por sua vez, em duas subespécies, de acordo com o fim a que a norma se refere, um fim possível ou um fim real, isto é, um fim que os homens podem deixar perseguir ou não, ou um fim que os homens não podem deixar de perseguir.

Entende-se os posicionamentos de Bobbio e Kant, vimos que a lei moral prevalece nos casos do aceite ad populum, deste modo, não prospera em sua finalidade como costume, pois esbarra na ilegalidade no comércio ambulante nos trens e metros da capital.

Não só este caso é passível de diversas discussões, pois existem muitas normas com sua eficácia estatuídas em nosso ordenamento de muitos anos, não acompanhando as transformações e costumes e adaptações que a sociedade constantemente pratica, ficando claro que o intuito é deixar aberto que o caráter positivo nem sempre faz jus ao mundo real que vivemos, deixando uma última provocação.

A nossa Magna carta³ em seu Art.5˚, XII registra, in verbis: XIII – é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer

Oras, se foi entendido pela Corte de Vértice, no entendimento hermenêutica sobre eficácia ampla deste inciso na prática da profissão de jornalista, Recurso Extraordinário RE 511961. Por que não a liberação dos profissionais informais? Sem mais.

“In dubio, studium”.

 

Post scriptum

Certas normas estão em nosso ordenamento jurídico, porém, a sua validade e eficácia, poderia ser contida, pois a realidade econômica e social conta mais.

 

Bibliografia

 

[1] https://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1940-1949/decreto-lei-2041-27-fevereiro-1940-411979-publicacaooriginal-1-pe.html.Acesso em: 22. Jul 2022.

[2] BOBBIO, Norberto, Teoria da Norma Jurídica, /Norberto Bobbio; tradução de Ariani Bueno Sudatti e Fernando Pavan Baptista; apresentação de Alaor Caffé Alves. 6. ed. São Paulo, editora Edipro, 2016. P. 92.

[3] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm

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Rafael Souza

Bacharel em Direito pela Faculdade Das Américas (FAM). Membro colaborador da Comissão dos Acadêmicos de Direito da 116a Subseção Jabaquara- Saúde da OAB/SP. Membro Assistente da Comissāo de Direito Constitucional e Filosofia e Argumentaçāo da 116a Subseção Jabaquara- Saúde da OAB/SP. Membro assistente do IGOAI (International Group of Artificial Intelligence) Colunista do Blog Justalks.

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