Você sabe o que é crime preterdoloso? Não me restam dúvidas de que provavelmente você já se perguntou sobre isso enquanto folheava seu livro de Direito Penal, ou enquanto estava estudando para o tão sonhado concurso. Mas existe maneira mais simples de entender o que é isso? Continue lendo esse Jus Explica e me conta nos comentários.
Direto do código
O crime preterdoloso se configura quando o agente cometendo um crime em sua forma dolosa, obtém um resultado inesperado de maneira gravosa ao que dantes pretendia. Ou seja, é uma espécie de crime majorado pelo resultado posterior em sua forma culposa.
No Art. 18 inciso I do Código Penal brasileiro [1], diz-se o crime doloso:
“I – doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo;(Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”.
Desta forma, nota-se que o dolo é a consciência cognitiva e a vontade. Já a culpa encontra-se no inciso II do mesmo artigo.
“II – culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia.
Parágrafo único – Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente”.
Já a culpa é configurada de maneira holística pela previsibilidade dos seguintes quesitos:
- Imprudência: que é o agir afoito, sem pensar, sem prévia ponderação;
- Negligência: sendo o desleixo com as precauções anteriores, é a omissão de se tomar certos cuidados prévios exigidos pela praxe;
- Imperícia: que é uma espécie de imprudência profissional. É a reprovável ação sem as qualificações e o conhecimento técnico exigido para um ato.
Tendo o conceito em mente poderemos entender que crime preterdoloso está previsto no Art. 19 do CP [2]. “Pelo resultado que agrava especialmente a pena, só responde o agente que o houver causado ao menos culposamente. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”. Desta forma imagina o seguinte exemplo:
Zé das Couves que sofre de uma ojeriza profunda contra seu vizinho Mel das Meninas, resolve entrar na academia com o objetivo de ficar forte e assim resolver na pancada seu assunto com o vizinho. Após tomar o espinafre do Popeye, Zé das Couves encontra seu desafeto na rua e decide levar a cabo todo seu treinamento, entrando nas vias de fato com Mel das Meninas. Não obstante ao desferir o golpe, não se contêm, causando-lhe ainda maiores golpes que por fim leva a sua triste morte. (Lesão corporal seguida de morte previsto no art. 129, § 3º, CP)
Observe que no exemplo, Zé das Couves tinha o objetivo apenas de bater em Mel das Meninas (dolo) mas sem querer causou sua morte (culpa). Isso é considerado crime preterdoloso.
Na jurisprudência
DA ORIGEM DA PALAVRA
No artigo publicado no site do Jus Brasil pela Dra. Jeanne Ambar ensina sobre a etimologia da palavra:
Buscando na etimologia da palavra, “prae” tem sua origem no Latim e significa “antes, devido a”, refere-se ao que é prévio. Do “prae”, veio “praeter”, que dá a ideia de “além de”, sendo assim, diz respeito ao resultado que vai além do dolo, ou que vai além da vontade do agente, ou até mesmo que não veio do dolo.
Quando, numa ação, forem encontradas as condutas dolosa e culposa, haverá um crime preterdoloso, pois há uma combinação de dolo na conduta inicial e culpa no resultado que sobreveio, ou seja, no resultado final.[3]
CONCLUSÃO
Na prática do direito, a classificação do crime para preterdoloso tem como objetivo atenuar uma conduta criminosa grave cuja causa fundamenta-se tão somente na culpa do agente. Isso previne que excessos sejam cometidos pela justiça e garante o princípio da culpabilidade. Nas palavras de Guilherme Nucci lemos:
“O princípio da culpabilidade encontra-se previsto de maneira implícita na Constituição, justamente porque não se pode, num estado Democrático de Direito, transformar a punição mais gravosa que o ordenamento pode impor (pena) em simples relação de causalidade, sem que exista vontade ou previsibilidade do agente”.
Sendo desta maneira querido leitor, sigamos a sabedoria de Pablo Neruda, um poeta chileno que disse certa vez “Você é livre para fazer suas escolhas, mas é prisioneiro das consequências”. Ou de Ezra Taft Benson que ensinou “Você é livre para escolher, mas não tem liberdade para alterar as consequências de suas decisões.” Certamente um bom conselho antes de entrar numa enrascada dessas.
Referências e Bibliografia
[1] https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10637924/artigo-18-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940 – 17/02/2022 – RJ
[2] https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10637770/artigo-19-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-1940– 17/02/2022 – RJ
[3] https://jeannecarla.jusbrasil.com.br/artigos/502613436/crime-preterdoloso – 17/02/2022 – RJ
[4] NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal: parte geral: parte especial, Editora Revista dos Tribunais 2013. – 17/02/2022 – RJ
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