Comum ler manchetes de jornal e encontrar a seguinte frase “Fulano foi preso e após pagar fiança e foi liberado”. E essas situações podem causar bastante confusão no leitor, afinal, como pode o criminoso ter sido preso e ser solto tão rapidamente?
Esse tipo de questão acontece pelo desconhecimento do público amplo nas diferentes formas de prisão que existem no ordenamento jurídico brasileiro, principalmente entre prisão pena e prisões cautelares (provisórias). Não é raro, por exemplo, que até mesmo investigados confessos sejam liberados após o pagamento de fiança.
Esse texto é dedicado a explicar como isso pode acontecer e quais são as leis e fundamentos que permitem que investigados sejam presos preventivamente e outros, mesmo confessos, sejam soltos.
Uma diferença essencial: prisão pena e prisão provisória.
Inicialmente faremos uma separação e diferenciação entre o que é uma prisão para execução da pena e o que é uma prisão provisória.
A prisão pena é aquela imposta em uma sentença condenatória dentro de um processo penal. É somente nessa forma de prisão que podemos falar em culpa, pois ela acontece somente ao fim do processo com a sentença judicial condenatória.
Todas as outras formas de prisão são essencialmente diferentes dessa, pois nelas não se pode falar em culpa do detido, nelas o investigado é presumido inocente até que uma sentença diga o contrário. Enquanto que a prisão pena acontece apenas após a sentença, as demais só acontecem antes dela. A prisão Temporária, por exemplo, só pode acontecer durante o inquérito policial, mas a prisão preventiva pode acontecer tanto no inquérito quanto durante o processo judicial.
Prisão Provisória
As prisões provisórias, ou cautelares, podem ser dividias em três:
- Prisão em Flagrante
- Prisão Temporária
- Prisão Preventiva.
Cada uma tem uma regra, um motivo e um momento certo para seu uso, e a utilização indevida pode até mesmo ser considerada abuso de autoridade.
Prisão em Flagrante
É a forma mais simples e corriqueira de prisão. Está disposta entre os artigos 301 e 310 do Código de Processo Penal.
Acontece quando o autor do crime (ou seja, quando se sabe quem seja o autor) é pego no ato do crime, ou acabou de cometê-lo. O art. 302 nos diz que pode ser flagrante próprio, quando o ator está cometendo ou acabou de cometer o crime; impróprio quando é perseguido imediatamente após o crime, até que seja capturado; e o presumido quando o agente não é perseguido, mas é encontrado é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.
Uma outra diferença pode ser quanto à obrigatoriedade de declarar a prisão em flagrante. Todos os cidadãos podem dar voz de prisão contra quem se encontre em estado de flagrante delito, mas essa é uma faculdade, uma opção. Talvez um cidadão não queira se colocar no caminho de um criminoso, temendo pela sua segurança.
Mas um agente de segurança pública, como os policiais, não tem essa faculdade, para eles é obrigatória a determinação da prisão em flagrante.
O que acontece com o preso em flagrante?
O art. 304 nos explica qual o procedimento: o preso deve ser apresentado à autoridade competente (delegado de polícia), devendo ouvir o preso e as testemunhas da prisão e interrogatório, lavrando também o chamado auto de prisão em flagrante.
Após o auto o delegado tem 24h para entregar ao preso a nota de culpa, que dá conhecimento ao preso dos motivos da sua prisão. Também em 24h deverá ser informado ao juiz, para que ele verifique a legalidade da prisão em flagrante, podendo ser mantida como está, ser convertida em prisão preventiva ou ser relaxada ser for ilegal (liberdade imediata e sem condições).
Fiança
Uma possibilidade também é o arbitramento de fiança pelo delegado, o Art. 322 do código de processo penal nos diz que a autoridade policial poderá conceder fiança nos casos de infração cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a 4 (quatro) anos. Caso a pena seja maior, a fiança será requerida ao juiz, que decidirá em 48 (quarenta e oito) horas.
Prisão Preventiva
Ao analisar a prisão em flagrante o juiz irá buscar compreender as situações fáticas que a envolvem, se ele verificar que se trata de uma prisão ilegal, o preso será posto em liberdade sem mais questionamentos. Mas se a prisão for legal, ele também poderá avaliar a sua conversão em prisão preventiva, que deverá proceder após
Esse caso é na mais uma exceção posta à lei, mas não por isso as conversões são frequentes. Para isso, existem alguns critérios. Eles estão nos artigos 312 e 313 do Código de Processo penal.
A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do investigado. Além disso, a prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares, como a vedação de se ausentar da comarca (ou município) sem o conhecimento do juiz.
Ela só cabe em crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 anos; se tiver sido condenado por outro crime doloso (transitado em julgado); se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência ou também quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida.
Garantir a segurança
A preventiva, portanto, é uma medida cautelar que visa garantir a ordem jurídica social. Ela só pode ser decretada pelo juiz, mediante requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial. Pode ocorrer qualquer fase da persecução penal (inquérito ou processo), ou ter origem na conversão da prisão em flagrante.
A prisão preventiva deverá sempre ser motivada e fundamentada em um receio de perigo e na existência concreta de fatos novos contemporâneos que justifiquem a aplicação da medida. O caso em que exista o receito concreto de que se posto em liberdade o investigado irá fugir, por exemplo.
Uma vedação que a lei volta a repetir é a de que essa prisão não é admitida com a finalidade de antecipação de cumprimento de pena ou como decorrência imediata de investigação criminal ou da apresentação ou recebimento de denúncia.
De toda forma, a prisão deverá ser revista no prazo de 90 dias, em que enfrenta todas as condições e fundamentos anteriores e avalia se ainda estão presentes os requisitos. O que, essencialmente, não significa que tenha prazo máximo, somente que deverá ser revista.
Prisão Temporária
A prisão Temporária, por outro lado, não é regulada no código de processo penal, mas na Lei 7.960/89. Diferentemente da prisão preventiva, a temporária só pode acontecer durante a investigação criminal, e não durante o processo.
Sua função é a de assegurar a eficácia da investigação criminal, quando em liberdade, o investigado põe em risco o sucesso da investigação.
Podemos encontrar os requisitos para a decretação da temporária no art. 1° da Lei 7.960/89. Assim, a prisão temporária será decretada quando for imprescindível para as investigações do inquérito criminal e/ou quando investigado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade. Não é necessário que ambos os requisitos estejam presentes, mas é necessário que esteja ao menos um destes somado de fundada razão (fortes evidências) de autoria ou participação do indiciado nos crimes elencados na Lei 7.960/89, como homicídio doloso, extorsão, roubo, entre outros.
Mediante requerimento
Nesse caso, o juiz também não pode decretar a prisão de ofício e deve ser provocado para tal. Os responsáveis por essa provocação é a autoridade policial ou o Ministério Público, que representam ao juiz, que irá acolher ou não os argumentos para a decretação de prisão.
Se o pedido for feito pela polícia, o juiz deve ouvir também o MP, se o pedido for pelo MP, não há necessidade de ouvir a autoridade policial. Feito o pedido por um destes, o juiz tem 24h para decidir de forma fundamentada sobre a questão.
Decretada, a prisão tem prazo de cinco dias, podendo ser prorrogada por mais cinco se comprovada necessidade.
Crimes Hediondos
Uma outra regra a ser observada é que caso um desses crimes venha a ser um crime hediondo, tráfico, terrorismo ou tortura, o prazo muda e passa a ser de 30 dias, prorrogável por mais 30, também se houver comprovada necessidade.
Preventiva VS Temporária
Elas possuem duas semelhanças, mas entre ambas fica clara uma grande diferença: a prisão temporária é sempre mais restrita, e exaurido seu prazo, dificilmente é renovado. Já a preventiva é mais abrangente e maleável, pode ser aplicada de forma mais extensiva.
É possível dizer que a temporária se faz para a colheita de provas pela polícia, que então poderá utilizá-las para um pedido de prisão preventiva, em que se objetiva evitar que o investigado, estando preso, não possa continuar agindo delituosamente.
Por ter um prazo que pode ser renovado a cada 90 dias, a prisão preventiva muitas vezes se mantém durante todo o inquérito policial e processo penal, cessando apenas com a condenação ou absolvição do réu.
Para que não se converta em prejuízo do réu, o tempo passado em prisões preventivas pode ser deduzido do tempo de condenação, a chamada detração penal.
Bibliografia e Referências
Flagrante próprio ou perfeito, impróprio ou imperfeito, presumido ou ficto.
Qual a diferença entre prisão temporária e preventiva?
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